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Entrevista: Carreira de Ilustrações e Quadrinhos

Olá pessoal,

Hoje vamos falar sobre a carreira de ilustrações e quadrinhos. Para isso convidamos a Renata Nolasco que vem trabalhando com ilustrações e quadrinhos desde 2014 e tem um SITE maravilhoso com belíssimas ilustrações. Confira a entrevista:

 

Obrigada por estar conosco em mais uma entrevista, você poderia fazer um breve panorama sobre a profissão de ilustrações e quadrinhos no Brasil.

É muito difícil fazer um breve panorama de algo tão amplo e complexo. Ilustração engloba ilustração publicitária, galeria, editorial, animação… E cada uma delas tem suas subdivisões como 3D artist, storyboard artist, background artist, cartoonista, etc. Apenas dentro de quadrinhos você pode separar entre artistas que fazem tiras, graphic novels, super-heróis, colorização, letramento, arte-finalização… Quanto mais penso nisso, mais parece impossível pra mim explicar em poucas palavras como funciona o mercado de ilustrações e quadrinhos. O mercado também é diferente para quem veio de lugares diferentes – a grande maioria dos ilustradores, quadrinistas e animadores são brancos. O que eu posso dizer sem me sentir simplista talvez seja: é um mercado em expansão, a hora de ingressar nele é agora, e é um mercado em que você não sobrevive sozinho.

 

Você acha que tem diferença em relação aos outros países. Se sim qual é a mais relevante.

Trabalhei com o público gringo e o brasileiro em diferentes momentos e que mais me chama a atenção é como é mais fácil para pessoas de países de primeiro mundo entenderem que o ilustrador está exercendo uma profissão. É comum, com brasileiros, receber pedidos de trabalhos de graça ou a troco de divulgação, gente que tenta barganhar o seu preço, pergunta o valor e desaparece. Isso nunca aconteceu comigo com clientes estrangeiros. Pessoalmente acredito que seja por termos um histórico de desvalorização à cultura no nosso país e muitos ainda entendem arte como hobby. Isso, somado ao fato de que arte é supérfluo em comparação com outros serviços básicos para a sobrevivência como educação, saúde e alimentação, faz com que grande parte da população brasileira tenha outras prioridades e nossa clientela seja mais restrita.

 

A sua formação de Comunicação Social te ajudou nessa sua área de trabalho.

Me ajudou bastante, tanto em me proporcionar as melhores ferramentas para levar minha mensagem de forma clara e concisa para o público, como compreender a responsabilidade social de tudo que coloco no mundo.

 

Como foi seu início no trabalho de ilustrações e quadrinhos. Qual é a diferença para hoje?

Na época em que eu comecei a desenhar, estava havendo no Brasil um grande movimento em prol de visibilidade para mulheres quadrinistas. Foi nessa época que surgiu o Lady’s Comics, Zine XXX, Mulheres nos Quadrinhos e outros. Essas mulheres incríveis me influenciaram a fazer uma página no facebook onde postava minhas tiras e eventuais ilustrações. Hoje, muitas dessas iniciativas não existem mais. Conversando com outras amigas de profissão sobre isso, chegamos a conclusão de que talvez seja porque passamos muito tempo dizendo “ei, nos escutem, parem de nos ignorar, nós estamos aqui!!” e agora cada uma de nós está concentrada em mostrar o que nós fazemos, agora que conseguimos que os olhos se voltassem em nossa direção. Ainda temos muito caminho pela frente, mas andamos um bocado. Na edição deste ano da CCXP, metade do Artist’s Alley são mulheres. Em 2017 não éramos nem um terço das participantes.

 

Como é o seu processo de criação e como você se organiza para fazer suas ilustrações e quadrinhos.

Meu processo com ilustrações é bem diferente do que faço com quadrinhos. Ilustrações podem ser mais espontâneas. Às vezes, eu faço apenas a arte-final. Na maioria das vezes, porém, eu tenho a ideia, então faço um esboço rápido, depois um esboço mais detalhado, a lineart e por último colorização. Todo o meu processo, hoje, é digital. Muito raramente uso papel e caneta pro esboço (ainda acontece às vezes, mas majoritariamente apenas pra definir a disposição dos elementos, não faço nenhum detalhe). Com quadrinhos, meu primeiro passo é definir quanto tempo quero passar naquele projeto. A partir disso eu posso então definir quantas páginas ele pode ter, pra se encaixar nesse período de tempo. Então eu vou destrinchar a história e encaixar os atos no número de páginas que me dei pra concluir o projeto. Só depois começo a desenhar. Primeiro faço os thumbnails da HQ inteira, levando em consideração as viradas de página e toda experiência de leitura, já deixando os balões de texto prontos. Então, começo a finalizar por capítulos. Procuro fazer o primeiro e o último capítulos antes de qualquer outra coisa, assim a consistência do traço pode ser mantida durante todo o processo. Às vezes, em projetos longos de 1 ano, 2 ou mais, nosso traço pode mudar no meio. Se você já tem o último capítulo pronto antes de desenhar o miolo, o seu leitor vai notar menos a diferença.

 

Conte para nós sobre sua participação no Festival Internacional de Quadrinhos (FIQ).

O FIQ 2015 foi o meu primeiro evento de ilustração/quadrinhos, bem quando estava começando a desenhar. Na época, eu nem fazia quadrinhos. Fui com uma revista que organizei com outras mulheres, a Revista Farpa (fiz a diagramação e parte da organização, fomos uma revista multidisciplinar com o objetivo de dar visibilidade para arte produzida por mulheres). Levei algumas ilustrações e um zine sobre o Manifesto Riot GRRRL que fiz com uma amiga. Foi uma experiência incrível, conheci muitos quadrinistas que admirei por anos e amigos que tenho até hoje. Foi a primeira vez que entendi que era viável viver de arte no Brasil.

 

Qual ilustração mais gostou de fazer e porque?

De trabalho pessoal, provavelmente foi uma fanart do Mr. Wrench e Mr. Numbers da série Fargo na cama de um motel após concluírem uma missão. Tentei contar uma história com aquela ilustração e o resultado foi bastante satisfatório. Até hoje é provavelmente minha ilustração favorita. De trabalho comissionado, foi um que fiz esse ano pra Cartoon Network. Ilustrei pra eles um álbum da Marceline que está disponível no Spotify de Adventure Time (Marceline Canta: Timeless Songs). Nunca achei que veria meu trabalho em uma página oficial de um de meus cartoons favoritos, foi muito gratificante e divertido participar desse projeto.

 

Conte um pouco sobre seu trabalho como diagramadora

Eu trabalhei por cerca de 8 anos como Diretora de Arte em agências de publicidade. Saí da profissão este ano (2019), quando virei full-time ilustradora e quadrinista freelancer. Aprendi a diagramar com a profissão e ainda é uma habilidade muito útil pra mim enquanto quadrinista, saber fechar arquivos e lidar com gráficas. Vejo colegas sempre sofrendo com isso. Aprendam a diagramar!! Não é tão complicado quanto parece.

 

Fale um pouco sobre seu projeto Colabe Clube do Adesivo.

Somos um clube de assinaturas de duas viciadas em adesivos para outros viciados em adesivos por aí. Eu e Natália Prata fizemos o Colabe para servir de plataforma de divulgação à produção de artistas mulheres em forma de produtos simples e baratos. Os assinantes recebem em casa todos os meses uma cartela de adesivos feita por 5 ilustradoras diferentes, e cada mês tem um tema diferente que foi escolhido por votação em nosso Instagram.

 

Como você consegue monetizar com ilustração? Você pode dar dicas para quem começar e gostaria de viver desse trabalho.

É meio bizarro porque sei que é o contrário pra muita gente, mas grande parte da minha renda com arte vem dos meus quadrinhos, e não de ilustrações. É mais fácil monetizar ilustrações. Você pode ter uma cartela de clientes, ilustração comercial é um campo bem mais amplo, criação de produto é uma realidade. Já quadrinhos são majoritariamente autorais e raramente você vai conseguir um cliente que te pague pra isso (a menos que esteja focando em ilustrar pro mercado gringo, super-herói ainda paga bem). O Catarse e outros tipos de financiamento coletivo, onde você consegue administrar todo o dinheiro arrecadado com a publicação daquele projeto sem o intermédio de uma editora, é o que tornou viver de quadrinhos uma realidade pra mim. Claro, eu ainda faço ilustrações comerciais e elas são parte significativa de minha renda – promoções de dia dos namorados, ilustração e pet e essas coisas. Cada vez menos estou lidando com cliente final e migrando para projetos comerciais, mas é um ótimo lugar para começar. Participar sempre de eventos também é importante tanto para você ter um contato direto com o público quanto para fazer networking. No campo da arte, você não sobrevive sozinho. É preciso sim conhecer e interagir com as pessoas.

 

O que você pode falar sobre sua próxima HQ, Lapso.

Lapso é uma YA sci-fi sobre Veronica, uma bruxa recém-formada em Premonição que não consegue prever o futuro, mas está sendo perseguida por uma colônia alienígena que acredita que ela pode devido a uma propaganda que deu muito errado. Pan é o Sentinela Galáctico (em treinamento) designado a ajudar Veronica na fase final do programa para virar agente de campo, mas, sinceramente, talvez Veronica estivesse melhor sozinha. Os dois dariam um ótimo Sentinela se fossem uma só forma de vida. O problema (além da colônica alienígena assassina e as ameaças de despejo) é que as memórias de Veronica estão fragmentadas e a história acontece de trás pra frente! O começo dessa aventura está no fim, o fim está no começo e Veronica não faz ideia de onde vem essa estranha sensação de déjà vu. O lançamento de Lapso está programado pra 2020, ainda sem data final, mas estou focando no FIQ!

 

Você pode dar uma dica para quem quer ingressar nesta área e quem quer começar a fazer ilustração. Algumas dicas de programas (software) ou técnica de desenho.

Não tenha medo de colocar o seu trabalho no mundo. Ninguém vai te contratar se eles não sabem que você existe. Faça suas redes sociais, interaja com as pessoas, participe de eventos, genuinamente faça amigos, e entenda que não existe nada que não possa melhorar. O ilustrador que não se aperfeiçoa e escuta críticas morre na praia. O software é o de menos, conheço ilustradores profissionais que usam Sai, Photoshop, Procreate, Clip Studio… O que importa é sua habilidade. Eventualmente você vai achar o programa e o traço que funcionam melhor pra você. Estilo é só a reunião de suas referências, é algo orgânico que vem com o tempo. Continue estudando e desenhando sempre que possível e vejo você por aí!Entrevista por Tamires Mascarenhas

Algumas artes da Renata

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